O ambiente construído como fator determinante para o surgimento de doenças crônicas não transmissíveis

Autores

  • Carla Zanelatto Unidep

Palavras-chave:

Ambiente obesogênico, Doenças crônicas, Medicina

Resumo

O efeito do ambiente sobre a saúde humana vem sendo investigado, sobretudo, a partir da década de 1990, onde houve uma expansão de pesquisas que demonstraram a insuficiência de explicações puramente individuais sobre o surgimento das doenças. Na literatura científica a influência do ambiente na saúde mental se revela mais consistente em termos de causalidade, como por exemplo no estresse, ansiedade, síndrome do pânico e depressão.

Por outro lado, diferentes estudos também demonstraram associações entre o ambiente percebido, social, físico e construído e diferentes desfechos de saúde física, tais como hipertensão arterial sistêmica (HAS), obesidade e síndrome metabólica, havendo necessidade de explorar esse possíveis reflexos sobre as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) a curto, médio e longo prazo, especialmente através de estudos longitudinais (Zanelatto et al.2019; Malambo et al.2016; Araújo et al.2018; Chaix et al.2010; Diez Roux; Mair, 2010).

Contudo, na confecção desse editorial, buscou-se discutir o ambiente construído, entendido como os espaços, construções, ou objetos desenvolvidos ou modificados por indivíduos ou coletividades, como por exemplo, parques, edifícios, escolas, residências e outras edificações relacionadas a trabalho, transporte ou lazer (Sallis et al. 2006). Múltiplos são os mecanismos pelos quais o ambiente construído pode interferir no surgimento de DCNTs, especialmente relacionados a presença de recursos facilitadores ou inibidores de comportamentos e hábitos de vida considerados como saudáveis.

Bairros com maior proporção de áreas arborizadas, parques, ciclovias, vias ou trilhas para pedestre, calçadas e ruas pavimentadas de adequada conectividade e sinalização, favorecem o deslocamento a pé e a prática regular de exercício físico que é um fator protetor de morbidade e mortalidade, sendo essencial para a normalização de indicadores de perfis glicêmico e lipídico, bem como redução de peso corporal e pressão arterial. Tal fato merece destaque para a população idosa, que é mais acometida pelas DCNTs, visto que possuem maior disponibilidade em realizar atividades no bairro devido a aposentadoria e, portanto, necessitam de boa infraestrutura de vias para que se evite quedas e possíveis fraturas, oferecendo maior conforto e segurança na prática.

Da mesma forma, evidências na literatura científica apontam o papel de um ambiente obesogênico sobre o comportamento alimentar, que é entendido como a grande oferta, disponibilidade e facilidade de acesso a alimentos com gorduras saturadas, açucares simples e de elevada densidade energética, condições que favorecem a instalação da obesidade (Dantas et al.2019). Um dos componentes dentro da esfera de ambiente obesogênico que pode ser avaliado se refere ao local de residência ou de trabalho dos indivíduos, especialmente no que se refere a presença de pontos de venda de alimentos do tipo fast foods ou ainda a ausência de feiras de produtos regionais, como por exemplo hortifrúti nas áreas circunvizinhas.

Nesse sentido, as diferentes evidências apontadas na literatura direcionam para o reconhecimento e inclusão nas políticas públicas direcionadas ao controle de DCNTs, de estratégias para transformar os bairros no sentido de criação de mais espaços de lazer e convivência para a realização de atividades físicas, bem como a melhoria das condições de transporte, iluminação nos bairros e segurança dos bairros, bem como sugere-se uma melhor avaliação por partes dos estudos epidemiológicos da existência de ambientes considerados obesogênicos e seu possível impacto em termos de saúde pública e no que tange a promoção da saúde.

 

 

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Referências

ARAÚJO, C. A. H. DE . et al.. Ambiente construído, renda contextual e obesidade em idosos: evidências de um estudo de base populacional. Cadernos de Saúde Pública, v. 34, n. 5, p. e00060217, 2018.

DANTAS, R. R.; SILVA, G. A. P. DA .The role of the obesogenic environment and parental lifestyles in infant feeding behavior. Revista Paulista de Pediatria, v. 37, n. 3, p. 363–371, jul. 2019.

DIEZ ROUX, A. V.; MAIR, C. Neighborhoods and health. Annals of the New York Academy of Sciences, v. 1186, n. 1, p. 125–145, 2010.

Chaix B. et al. Individual/neighborhood social factors and blood pressure in the record cohort study: which risk factors explain the associations? Hypertension 2010; 55:769-75.

HINO, A. A. F.; REIS, R. S.; FLORINDO, A. A.. Ambiente construído e atividade física: uma breve revisão dos métodos de avaliação. Revista Brasileira de Cineantropometria & Desempenho Humano, v. 12, n. 5, p. 387–394, 2010.

MALAMBO P et al. . Association between perceived built environment and prevalent hypertension among South African adults. Adv Epidemiol 2016.

SALLIS JF, et al. An ecological approach to creating active living communities. Annu Rev Public Health. 2006;27:297-322.

SWINBURN B, EGGER G, RAZA F. Dissecting obesogenic environments: the development and application of a framework for identifying and prioritizing environmental interventions for obesity. Prev Med. 1999;29:563-70.

ZANELATTO, C. et al. Percepção das desordens de bairro e pressão arterial em adultos: um estudo multinível de base populacional. Cadernos de Saúde Pública, v. 35, n. 2, p. e00016418, 2019.

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Publicado

03-10-2023

Como Citar

1.
Zanelatto C. O ambiente construído como fator determinante para o surgimento de doenças crônicas não transmissíveis. Santé [Internet]. 3º de outubro de 2023 [citado 21º de dezembro de 2024];2(1):4-6. Disponível em: https://periodicos.unidep.edu.br/sante/article/view/238

Edição

Seção

Artigo Original